O padre que tinha a mania dos banhos gelados
Ficou conhecido como o “médico da água”. O sucesso comercial foi tanto que o nome Kneipp é usado para vender todo o tipo de produtos há mais de um século. Em Portugal, a família real visitou o único balneário kneippiano, nas Caldas de Monchique.
Sobrancelhas espessas e escuras, contrastantes com o cabelo branco; hábito de monge, expressão serena, porém resoluta. Reza a lenda que se terá curado da tuberculose com banhos frios no rio Danúbio e corridas curtas, descalço e ao ar livre. Este sucesso fê-lo buscar novos conhecimentos sobre o uso da água para tratar maleitas. Em pouco tempo, tinha milhares de seguidores…e inimigos, estes entre a classe científica, para quem era apenas um charlatão. Assim era Sebastian Kneipp, nascido numa remota aldeia alemã com paisagens dignas de postal ilustrado e feito trunfo turístico e best seller de produtos naturais.
A alimentação natural, baseada em legumes e fruta, o exercício físico e os banhos de água fria são a chave para uma vida longa e saudável. É nesta ideia, passível de estar em qualquer texto moderno sobre bem-estar, que se baseia a teoria do padre Kneipp, que viveu há quase 200 anos e criou uma terapia seguida até hoje em todo o mundo.
Sebastian Kneipp nasceu em 1821, numa família humilde. Estudou, fez-se padre e fintou o destino que lhe dava curto tempo de vida. Morreria só aos 76 anos de idade, depois de ter revolucionado a hidroterapia, tudo porque lhe foi parar às mãos um livro sobre as experiencias de Johann Sigmund Hahn (1696-1773), que resolveu aprofundar.
O “médico da água”, como também ficou conhecido, desenvolveu todo um método de tratamento com diversos tipos de banho, jatos e pulverizações; temperaturas diferenciadas e o uso de plantas medicinais.
Aparentemente, a contração dos vasos sanguíneos em contacto com a água gélida, seguida de rápida dilatação resultante do aquecimento corporal, proveniente do exercício físico, estimula a corrente sanguínea, o sistema nervoso e o metabolismo, ajudando as defesas naturais do organismo. À sombra deste legado, construíram-se estâncias termais e hotéis, um museu e uma verdadeira parafernália de produtos medicinais que transformaram em destino turístico a aldeia de Wörishofen – onde Kneipp viveu - e toda a região.
Em Portugal, anunciaram-se tratamentos kneippianos em vários pontos do país, mas segundo o que foi possível apurar, apenas as Caldas de Monchique tiveram uma sala de banhos que obedecia aos ensinamentos do seu criador.
Bentes Castel Branco, diretor daquelas termas, deslocou-se à Alemanha onde aprendeu com o próprio Kneipp, em 1889. A novidade correu pelo País e até a família real, em périplo pelo Algarve, visitou o balneário kneippiano, embora não tenha sido possível apurar se D. Carlos ou D. Amélia ali tomaram algum banho reparador.
À margem
Vincent Priessnitz, cujos estudos não terão sido estranhos a Sebastian Kneipp, é, para muitos, o pai da hidroterapia moderna. Nascido na Áustria, em 1799, também ele partiu da sua experiência pessoal, sendo a primeira cobaia das experiências que desenvolveu com água fria, para tratar entorses, cortes e até duas costelas partidas, que os médicos tradicionais terão afirmado não poderem ser consertadas. Defendia uma alimentação natural, mas ao contrário de Kneipp, rejeitava ervas e outras substâncias, porque entendia que a água é que era o agente da cura. Teve uma multidão de seguidores e, entre os que
recorreram às suas técnicas – que passavam por temperaturas extremas – terão estado o arquiduque Franz Carl, da Áustria e o dramaturgo Nikolai Gogol. Apesar de muito homenageado no seu país natal, não teve o mesmo sucesso comercial que o padre alemão cujo nome é usado para vender os mais variados produtos, de medicamentos e mezinhas anunciados na imprensa há mais de um século, aos modernos produtos de cosmética e dietética.
Mas isso é outra história…
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*Na rua do Salitre, em Lisboa, há um painel de azulejos que homenageia o padre que ficou conhecido como “médico da água”. A ideia terá sido do proprietário de uma ervanária que ali existiu e que vendia os produtos criados por Kneipp. Foi recentemente recuperado.
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Fontes
Realizações e utopias: o património arquitetónico e artístico das Caldas de Monchique na cenografia da paisagem termal, de Ana Maria Lourenço Pinto; dissertação de mestrado em Arte, Património e Teoria do Restauro, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa – 2013, disponível em:
http://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/11357/1/ulflL148032_tm.pdf
https://www.kneippianum.de/en/health-resort/sebastian-kneipp-cure.html
https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Sebastian_Kneipp_and_his_followers.jpg
http://www.southbaytotalhealth.com/Hydrotherapy.htm
https://tourismus.bad-groenenbach.de/urlaub/kur-gesundheit-wellness.html?L=0
http://en.bad-woerishofen.de/bad-woerishofen/sebastian-kneipp-museum.html
http://www.bassenge.com/bassenge/de/default.asp
https://www.dw.com/pt-br/1821-nasce-o-criador-da-hidroterapia-conhecida-como-kneippismo/a-521623
https://lifestyle.sapo.pt/saude/bem-estar/artigos/a-agua-da-vida
https://pt.aleteia.org/2017/10/20/cura-pela-agua-fria-surpreendente-metodo-padre-kneipp/
https://en.wikipedia.org/wiki/Vincenz_Priessnitz