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O sal da história

Crónicas da história. Aventuras, curiosidades, insólitos, ligações improváveis... Heróis, vilões, vítimas e cidadãos comuns, aqui transformados em protagonistas de outros tempos.

O sal da história

Crónicas da história. Aventuras, curiosidades, insólitos, ligações improváveis... Heróis, vilões, vítimas e cidadãos comuns, aqui transformados em protagonistas de outros tempos.

A escandalosa nyassada que enlameou o País

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Emissão ilegal de moedas e selos, suspeitas de corrupção e desvio de fundos, desaparecimento de documentos, subscritores fictícios, falsas declarações…enfim, uma sucessão de escândalos marcou o arranque da Companhia do Nyassa, à qual o Estado Português deu a administração da vasta área de Cabo Delgado, em Moçambique, onde pouco ou nada se fez.

Os jornais, especialmente os de inspiração republicana, fizeram um festim, tanto mais que o ambiente ainda estava tenso devido ao ultimato britânico, de 1890. A instabilidade, aliás, foi uma constante na história da Companhia do Nyassa, cuja formação foi autorizada no ano seguinte.

O objetivo era claro. Não tendo Portugal meios para exercer uma colonização efetiva como era obrigado pela pressão internacional, concedia essa prerrogativa a uma entidade privada, uma companhia majestática, que adquiria, assim, vastas competências na antiga província moçambicana de Cabo Delgado, com o dobro da área da Metrópole.

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Foi neste contexto que a firma Bernardo Daupias & Cª ficou com a administração e exploração daquele território, mas não tinha originalmente dinheiro para pagar a caução exigida, tendo de se rodear de outros investidores portugueses. Não obstante, pouco depois e ainda antes de tomar posse do território, o privilégio foi adquirido por capitais ingleses e franceses, passando a sede para Londres.

Nesse período deu-se um dos mais extraordinários episódios deste percurso atribulado.

George Wilson, o gerente da já então denominada Companhia do Nyassa, talvez inebriado com os amplos poderes daquela organização, mandou cunhar moedas com diversos valores e selos, que pretendia colocar em circulação na região sob a sua chancela. Pequeno grande problema: a autoridade para cunhar moedas e emitir valores selados pertence aos soberanos de estados e nações, não a empresas privadas.

moedas da companhia do Nyassa.png

 

Ao que constou, aquele cidadão britânico nunca pediu autorização para tal ousadia que violava as leis de Portugal, afinal, ainda o país ao qual pertencia a região, cuja posse ainda nem tinha sido concedida. Alegadamente, a administração da companhia também não foi informada.

Os valores chegaram a Ibo e os “patrões” de George Wilson desencadearam um conjunto de enérgicas movimentações no sentido impedir que as moedas – distribuídas por 136 caixotes – e os selos – dois caixotes deles – fossem postos a circular.

selos companhia do nyassa.jpg

O atrevido foi despedido e toda a remessa expedida para Lisboa, onde chegou a 3 de julho de 1895. As moedas foram derretidas e inutilizaram-se as estampilhas postais

Apesar da rapidez, não se conseguiu impedir que algumas unidades escapassem para as mãos de interessados, figurando hoje como exemplares raros em coleções privadas. Ostentavam uma misteriosa torre redonda fortificada, com ameias e merlões, cuja inspiração se desconhece, pois, aparentemente, não tem paralelo naquela região moçambicana e pode ser apenas fruto da imaginação fértil do inglês que as mandou produzir.

indigenas transportando mercadoria para embarque_m

Em paralelo com este triste episódio, uma portaria de 11 de setembro de 1894 deu finalmente autorização para a tomada de posse das terras, mas não faltou muito até que soassem novas histórias mirabolantes sobre a Companhia do Nyassa, que deram brado junto da opinião pública.

Durante meses, nos jornais da oposição, a palavra “nyassada” passou a sinónimo de barafunda, tranquibernias e embuste. O republicano Defensor do Povo, não se coibiu de apelidar de trapalhice, marosca, rapinagem e ladroeira as diversas irregularidades relatadas e que chegaram a ter eco em ação legal, com base em procedimentos à revelia dos estatutos e da lei, que se souberam devido a desentendimentos internos entre elementos do conselho de administração e do conselho fiscal.

grupo de indigenas e portugueses junto a casa.jpg

Na mira das notícias estavam sobretudo homens ligados à companhia e o comissário régio, a quem chegaram a chamar de “gatunos” cuja ação conspurcava o governo, suspeito de estar “cúmplice e enlameado no lodaçal do Nyassa”.

Ultrapassadas estas crises iniciais, os problemas não ficaram sanados. A firma mudou de mãos diversas vezes, sempre maioritariamente estrangeiras, o que contrariava as bases da concessão.

 

Cerca de 35 anos após a sua fundação, a Companhia do Nyassa continuava a encher páginas de jornal pelas piores razões: “deplorável orientação”, alienação ilegal de direitos e “péssima administração dos territórios de Cabo Delgado”, já então palco de conflitos e debandada das populações, algo que, tragicamente, se repete na atualidade.

 

À margem

As companhias majestáticas tinham a incumbência de fazer uma ocupação efetiva dos territórios, à qual Portugal se havia comprometido após a conferência de Berlim, em 1884/1885. Deveriam proceder ao reconhecimento do território, submeter à coroa portuguesa os chefes tribais revoltosos e explorar as riquezas naturais presentes, entregando uma parte do lucro ao Estado colonial.

Estas companhias eram uma espécie de estado dentro do Estado, mas, no caso do território de Cabo Delgado, praticamente tudo o que a concessão previa ficou por fazer ou sê-lo-ia tarde e a más horas. Até 1925, não se haviam construído escolas, nem a prometida linha de caminho-de-ferro ou a rede de telégrafo. Não se haviam arroteado e irrigado os terrenos, ou criado condições para a instalação de colonos.

A todos estes compromissos, a Companhia do Nyassa respondeu optando pela estratégia mais fácil e com menor investimento possível. Limitou-se a beneficiar da competência para cobrar impostos e taxas aduaneiras num vasto conjunto de exportações, obtendo uma boa parte dos seus proventos com a exploração de mão-de-obra forçada e mal paga, bem como com a sua exportação para a África do Sul e para outras províncias onde esta era mais necessária.

Isto, mais de um século após a abolição da escravatura na Metrópole (1773), cinquenta anos depois de ter sido decretada a proibição da exportação de escravos em todos os domínios portugueses (1836) e duas décadas passadas do decreto que aboliu a escravidão em todas as colónias portuguesas, passando à condição de libertos, todos os escravos (1869).

Mas isso é outra história…

 

Fontes

Manuel Joaquim de Campos, Moedas ilegais destinadas à áfrica Portuguesa, in O Archeólogo Português, vol XI, Museu nacional de Arqueologia, 1906.

Pedro Batalha Reis, Moeda Inédita da Companhia do Niassa, in  NVMMVS, nº10, Sociedade Portuguesa de Numismática, 12.1955.

António Miguel Trigueiros, Cobre Amoedado para a África Portuguesa, in  NVMMVS, nº2 S. IX/X, Porto, Sociedade Portuguesa de Numismática, 1986-1987

Hemerotena Digital Brasileira – Memória Brasil

O Defensor do Povo, 09, 12, 16, 26.05 e 02.06.1895.

 

Hemeroteca Digital de Lisboa

Gazeta das Colónias, 15.01.1925, 25.12.1924, 12.02.1925

 

https://hemerotecadigital.cm-lisboa.pt/Periodicos/GazetadasColonias/GazetadasColonias.htm

https://pt.wikipedia.org/wiki/Companhia_do_Niassa

https://www.parlamento.pt/Parlamento/Paginas/Memoria-extincao-escravidao.aspx

 

Imagens

Arquivo Nacional da Torre do Tombo

Arquivo Fotográfico da Companhia de Moçambique

PT/TT/CMZ-AF-GT/N/1/3/19

PT/TT/CMZ-AF-GT/N/2/1/1

 

Hemeroteca Digital de Lisboa

Illustração Portugueza

11.11.1907

Pedro Batalha Reis, Moeda Inédita da Companhia do Niassa, in  NVMMVS, nº10, Sociedade Portuguesa de Numismática, 12.1955.

A Mala-Posta: Os "misteriosos" selos de Cabo Delgado (1) (mala-posta1.blogspot.com)

Instantâneos (115): matar a sede de ferro, amor e inteligência

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Haverá muitos locais que façam bem ao corpo, ao coração e ao intelecto? Pois, na cidade do Porto existia um espaço com estes três atributos, ainda que nem sempre em simultâneo. A Fonte das Águas Férreas, erguida sobre uma nascente descoberta em 1784, foi, durante muito tempo, o poiso seguro para quem procurava esses diferentes tipos de conforto.

Provadas as qualidades medicinais do manancial ali encontrado, a área foi cedida ao município portuense, que construiu um chafariz com duas bicas, corria o ano de 1804.

Tinha a particularidade, única na cidade, de fornecer águas ferruginosas, alegadamente benéficas para quem padecia de anemia e outras fraquezas, ajudando a curar os males físicos e, em simultâneo, prover água potável de qualidade, algo que, por aquela altura, ainda não corria nas torneiras, porque as não havia em casa.

Não se estranha, por isso, que a afluência fosse muita. Tanta, que se mandou construir uma alameda com bancos, onde os debilitados se sentavam, enquanto bebiam copinhos de águas férreas, até estarem saciados ou terem cumprido a prescrição médica.

Ora, por aquelas épocas, as senhoras jovens eram amiúde acometidas desses abatimentos, bem como dos tormentos da alma próprios do romantismo – aquelas com algum estatuto, claro está, que as pobres não tinham tempo nem disposição para tais achaques. Não é preciso pensar muito para se perceber que, onde havia donzelas de família, rapidamente começaram a aparecer mancebos garbosos que as queriam ver.

Foi assim, que a Fonte das Águas Férreas passou a ser uma espécie de ponto de encontro informal embora “desencontrado” para esta juventude atormentada, que ali buscava consolo para o coração. Desencontrado, porque não eram tempos para liberdades e expressões públicas de afeto. As meninas vinham matar a sede sobretudo de manhã e os rapazes, que as observavam de longe, acorriam depois para poder beijar o copo usado pela sua amada.

Para que este platónico desiderato se desse, pagaram ao guarda, um pândego conhecido em toda a cidade como “Cartola”, naturalmente porque não saía de casa sem um desses chapéus altos na cabeça.

casa junto as aguas ferreas.png

Resta explicar como é que tal espaço fazia bem ao intelecto. É que, ali mesmo ao lado, viveu o historiador Oliveira Martins. Destacado no Porto por questões profissionais, frequentemente reunia com outros cérebros portugueses de alto gabarito: Antero de Quental, Guerra Junqueiro, Ramalho Ortigão e Eça de Queiroz, ilustres membros da brilhante “Geração de 70”.

O grupo de cinco, que se autointitulava “a matilha”, entretinha-se ali em animada cavaqueira e despiques culturais que, como se calcula, constituíam forte estímulo mental para os seus intervenientes.

A toponímia mantém a memória das águas férreas, a casa ainda existe, mas a fonte deu lugar a um parque de estacionamento.

No entanto, não se perdeu: foi desmantelada e reerguida – embora não como originalmente – no Parque da Cidade. Na pedra ainda se guarda registo da dupla utilidade – águas medicinais e águas “domésticas” – pois a ferrugem impregnada não deixa dúvidas sobre qual era a bica que tinha a preferência das raparigas anémicas e casadoiras.

fonte das aguas ferreas parque da cidade.png

 

 

Fontes

Germano Silva, Porto desconhecido & insólito, Porto Editora, 2015.

 

Germano Silva, Porto – As histórias que faltavam, Porto Editora, 2021.

 

Arquivo Municipal do Porto

Asilo de Mendicidade, Exemplar do semanário Revista Popular, n.º 24, PT-CMP-AM/COL/GRA/D.GRA:1.159

PT-CMP-AM/COL/GRA/D.GRA:1.159

 

 

 

Hemeroteca Digital de Lisboa

Revista Popular: semanario de litteratura e industria, 1848-1855.

 

 

Sistema de Informação para o Património Arquitetónico, Direção-Geral do Património Cultural, texto de Isabel Sereno, 1996, em

Monumentos

 

"A fonte de águas férreas é apenas mais um dos motivos de interesse histórico e patrimonial do Parque da Cidade” (sapo.pt) programa de Joel Cleto, Porto Canal.

 

PORTO, DE AGOSTINHO REBELO DA COSTA AOS NOSSOS DIAS: FONTES E CHAFARIZES - III (portoarc.blogspot.com)

 

Histórias da Cidade: Cinco “cães” a uma pedra e outras tertúlias em águas férreas - Portal de notícias do Porto. Ponto.

 

Imagens

Fonte das Águas Férreas, antes e depois, Germano Silva, Porto desconhecido & insólito, Porto Editora, 2015.

 

Arquivo Municipal do Porto

Palácio dos Sousa Mello, F-NP/CMP/7/3848; F-P/CMP/10/371(3)

Todos os sons do mundo na mesma caixa

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Parecia magia! Quem fechasse os olhos facilmente pensaria estar perante dezenas de músicos, freneticamente tocando os seus instrumentos luzidios. Afinal, toda música vinha do móvel da sala e cada lar abastado podia agora ter a sua própria orquestra privativa, movida a vapor, por eletricidade, água, gás ou petróleo. Um feito notável!

 

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De 100 a 1000 instrumentos musicais ao seu dispor, na sua casa. Uma verdadeira orquestra automática e portátil – com alguma boa-vontade e força - ao alcance de qualquer um com bolsos suficientemente recheados e casas razoavelmente desafogadas para acolher tal prodígio. Era esta maravilha da técnica, na época com uma aura de magia, que prometia a máquina musical inventada pelo alemão Michael Welte, nos confins da Floresta Negra, e que Lisboa pôde ouvir pela primeira vez em novembro de 1895, já com muitos aperfeiçoamentos e melhorias (nesta imagem).

Era na Empreza-Liquidadora, em plena avenida da Liberdade, números 28-48, que se daria a primeira exibição, destinada apenas a um reduzido e privilegiado grupo de convidados do sr. José dos Santos Libório (ver À Margem), proprietário e gerente da firma.

O aparelho, produzido pela Haberer, segundo patente da M. Welte & Sons, fazia furor por toda a Europa.

Para além da estética apurada do móvel, os sons que emitia provocavam um efeito verdadeiramente surpreendente nos afortunados que os escutavam, tendo-se “a impressão de estar ouvindo uma orquestra humana, tal a qualidade da “execução e correção nítida das vozes”, independentemente do modelo, já que os Welte patentearam um elevado número, adaptados a diferentes espaços e graus de exigência.

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Em comum tinham a reprodução de trechos musicais com a presença de múltiplos instrumentos, bem como composições cantadas. O “milagre” era feito “por meio de contrapesos”, num movimento que podia ser obtido “a vapor, por eletricidade, água, gás ou petróleo”. Muito versátil, como se pode perceber.

Daí, talvez, o enorme sucesso destas máquinas, com diversos galardões de ouro em feiras internacionais e merecendo a escolha de gente famosa.

Ao que se afirma na imprensa da época, Adelina Patti, a maior estrela lírica daquele tempo, tinha um dos modelos mais complexos, mas não estava só nas suas preferências.  Entre outros, também o Imperador da Rússia; o rei da Roménia; o sultão da Turquia; o Duque de Baden, Khediva, do Egipto; os príncipes da Bulgária; Rajás e Marajás; o barão de Rothschild; marqueses e, finalmente, empresários de salões de concerto e companhias de navegação tinham orquestras automáticas produzidas pela Haberer.

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A ideia era agora cativar o público português pois, a seguir à primeira e exclusiva demonstração, previam-se outras, de entrada livre, a que poderiam assistir todos os interessados em ver e adquirir estes verdadeiros assombros de modernidade.

As orquestras automáticas* fazem parte de um conjunto de aparelhos de música mecânica que começaram a banalizar-se em finais do século XIX, entre os quais se destaca o fonógrafo, inventado por Thomas Edison, em 1877 e que se estreou perante os lisboetas dois anos depois, no Teatro da Trindade.

Estando resolvido o problema da gravação dos sons, o céu era o limite.

Michael Welte já tinha criado a sua primeira orquestra numa caixa entre 1845 e 1848. Era capaz de imitar mais de mil sons diferentes, através de rolos dentados, e tinha sido encomendada por um cliente de Odessa. Chamaram-lhe “Orchestrion” e, em 1865, o filho, Emil, já tinha um salão de demonstrações em Nova Yorque.

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A empresa, que sobreviveu um século (entre 1832 e 1932), criou dezenas de modelos – para além de órgãos, pianos e relógios, para uso doméstico, teatral e religioso - tendo-se notabilizado pelo refinamento do som e pela invenção e introdução de inovações, como originais sistemas de vácuo e rolos de papel, passíveis de serem produzidos de forma mais rápida e económica.

Sempre a inovar, já nesse derradeiro ano e com outro proprietário – Karl Bocksch - a M. Welte & Sons ainda foi capaz de criar um órgão eletrónico equipado com foto células, o primeiro a usar som por camadas. Não vingou, porque o inventor, Edwin Welte, era casado com uma judia, Betty Dreyfuss, e viu-se obrigado a parar o projeto. De resto, a fábrica alemã seria bombardeada e destruída durante a II Grande Guerra.

Fica aqui um registo do modelo Brisgovia dos Welte

Welte "Brisgovia" Style D Orchestrion (youtube.com)

 

À margem

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O português José dos Santos Libório, o patrão da Empreza-Liquidadora, viria a ser, anos mais tarde, um dos principais negociantes de arte e antiguidades, tanto em Portugal, como no Rio de Janeiro, onde se instalou a partir de 1910.

Estendeu os seus negócios a um cinematógrafo, um balcão de venda de bilhetes para espetáculos, um teatro infantil e até um casino - o Grande Casino de Paris - em Lisboa, que ocupou o lugar da Empreza-Liquidadora, quando esta encerrou, em 1906.

Antes, tinha começado por ser um importante organizador de leilões, sendo a sua empresa pioneira desta atividade no nosso País. Foi responsável pela venda de importantes lotes de peças de arte dos artistas mais valorizados e possuía uma clientela que incluía a Casa Real Portuguesa, a mais alta aristocracia e a elite cultural nacional.

Vendia de tudo um pouco, sobretudo artigos de luxo - decoração, pratas, mobiliário e joias - que vinham de diversos países europeus, que Libório visitava, assegurando fornecimentos e até formação específica na área de leilões.

Já no Brasil, teria um papel fundamental na divulgação de artistas portugueses, comercializando inúmeros exemplares de pintura, escultura, cerâmica e marcenaria nacionais, de diversas épocas e estilos, promovendo aparatosas exposições e leilões.

Tão conhecido era este empresário, que não escapou à pena de Rafael Bordalo Pinheiro, que aqui o retratou, legendando que Libório, o grande liquidador, só não conseguia liquidar as responsabilidades da questão do Nyassa, aludindo a um escândalo que deu brado pelo ano de 1895.

Mas isso é outra história...

…………………

*Uma enorme coleção, que espelha precisamente a diversidade de aparelhos que então surgiram, pode ser conhecida no Museu de Música Mecânica, na zona do Pinhal Novo, Palmela.

Home - Museu da Música Mecânica (museudamusicamecanica.com)

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Fontes

Hemeroteca Digital de Lisboa

Diário Illustrado, 08.11. 1885

O António Maria, 23.11.1895

O Occidente, 15.04.1878

 

Hemeroteca Digital Brasileira - Memória Brasil

O Tico-Tico, 06.1913

 

Vera Mariz, José dos Santos Libório (1850-1923), um notável elo de ligação entre os mercados de arte português e brasileiro, in MODOS. Revista de História da Arte. Campinas, v. 2, n.2, p.271-291, 05.2018. Disponível aqui: https://www.academia.edu/36732899/Jos%C3%A9_dos_Santos_Lib%C3%B3rio_1850_1923_um_not%C3%A1vel_elo_de_liga%C3%A7%C3%A3o_entre_os_mercados_de_arte_portugu%C3%AAs_e_brasileiro

 

https://www.mechanicalmusicpress.com/history/welte/wt_index.htm

https://commons.wikimedia.org/wiki/Category:Michael_Welte

https://www.musikautomaten.ch/mma/it/home/britannic-orgel/storia-della-ditta-welte/orchestrion.html

https://restosdecoleccao.blogspot.com/2018/08/phonographo-e-gramophone-em-portugal.html

https://en.wikipedia.org/wiki/Orchestrion

Regional Historical Museum in Gabrovo keeps the only orchestrion in Bulgaria - Culture (bnr.bg)

Patents for the Welte-Orchestrion - Welte-Mignon

 

Instantâneos (114): os legionários e a mocidade a brincar aos soldadinhos

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Homens jovens fardados, alinhados, certinhos, marchando pelas ruas…poderiam estar em qualquer localidade deste País, mas, por mero acaso, estes estão em Alcácer do Sal, vila alentejana de branco casario, nos anos 40 do século XX.

São elementos da Legião Portuguesa, desfilando durante a visita do Chefe de Estado, Óscar Carmona, em 1949.

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A Legião e a Mocidade portuguesas foram das mais emblemáticas instituições criadas durante o Estado Novo, como forma de mobilizar e condicionar os cidadãos, inculcando os princípios do regime.

Funcionavam muito à semelhança de organizações do mesmo género que surgiram em outros países com sistemas totalitários, como a Alemanha Nazi.

Em Alcácer do Sal, como, aliás, acontecia de Norte e Sul, funcionaram estruturas de ambas e as imagens mostram-nos um pouco da sua atividade, bem como os uniformes usados pelos seus membros.

A Legião Portuguesa foi fundada em 1936, com o objetivo de "a organizar a resistência moral da Nação e cooperar na sua defesa contra os inimigos da Pátria e da ordem social".

Esta milícia tinha um carácter voluntário e inspiração militar, assumindo-se como a pátria em armas, na defesa dos ideais preconizados pelo Estado Novo. Contribuiu para a subordinação das forças armadas ao regime e colaborou ativamente na rede de informações da polícia política, nomeadamente, no controlo dos movimentos de esquerda.

Durante muito tempo, a porta de acesso à atual sala de exposições da Biblioteca Municipal de Alcácer do Sal - edifício à esquerda, nas duas imagens - servia de entrada para a sede local da Legião Portuguesa. Ali aconteciam reuniões, treinos e paradas, como aquela que se vê na fotografia. Um dos pontos altos ocorreu em abril de 1940, com a visita do Comandante-Geral, Casimiro Teles, que passou revista às “tropas” e condecorou alguns membros locais.

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Já a Mocidade Portuguesa, criada no mesmo ano da Legião, pretendia enquadrar as crianças e jovens dos sete aos 14 anos de idade, para que, como entoavam em uníssono, “cantando e rindo”, prosseguissem o sonho lindo de erguer a Nação, louvando os seus heróis

Nas terceira, quarta e quinta imagens vemos exercícios da Mocidade Portuguesa, que envolveram acampamento na cerca do castelo de Alcácer do Sal e passeio em galeão, no Sado.

A Mocidade Portuguesa era de participação obrigatória e tinha em vista “estimular o desenvolvimento integral” da capacidade física da juventude, “a formação do carácter e a devoção à Pátria, no sentimento da ordem, no gosto da disciplina e no culto do dever militar”.

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No processo, como parece claro, incutiam-se os princípios e os valores do regime liderado por António de Oliveira Salazar.

No ano seguinte, instituiu-se igualmente a Mocidade Portuguesa Feminina, onde se reforçava o papel social então destinado às mulheres, como esposas e mães.

 

Tanto a Legião, como a Mocidade Portuguesa foram extintas com o 25 de abril de 1974, há meio século.

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Adaptado de texto da mesma autoria – Cristiana  Vargas - publicado originalmente no jornal Voz do Sado em janeiro de 2024, no âmbito dos 50 anos do 25 de abril.

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Fontes

Arquivo Municipal de Alcácer do Sal

Fundo Baltasar Flávio da Silva

 

AATT - Comissariado Nacional da Mocidade Portuguesa

Mocidade Portuguesa – Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org)

Lá Vamos, Cantando e Rindo de 18 mai 2018 - RTP Play - RTP

Legião Portuguesa (Estado Novo) – Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org)

Legião Portuguesa (1936) - Infopédia (infopedia.pt)

 

Imagens

Arquivo Municipal de Alcácer do Sal

Fundo Baltasar Flávio da Silva

 

PT/ AHMALCS/CMALCS/BFS/01/02/01/024/001

PT/ AHMALCS/CMALCS/BFS/01/01/08/001

PT/ AHMALCS/CMALCS/BFS/01/01/08/006

PT/ AHMALCS/CMALCS/BFS/01/01/08/007

PT/ AHMALCS/CMALCS/BFS/01/01/08/008