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O sal da história

Crónicas da história. Aventuras, curiosidades, insólitos, ligações improváveis... Heróis, vilões, vítimas e cidadãos comuns, aqui transformados em protagonistas de outros tempos.

O sal da história

Crónicas da história. Aventuras, curiosidades, insólitos, ligações improváveis... Heróis, vilões, vítimas e cidadãos comuns, aqui transformados em protagonistas de outros tempos.

A terra voltou a tremer em novembro

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Em Setúbal, bairros inteiros foram arrasados, mas Lisboa também não escapou ilesa. Cento e três anos após o grande terramoto, os abalos sentiram-se em todo o País.


Pouco passava das sete horas da manhã do dia 11 do já antes funesto mês de novembro. A terra voltou a tremer 103 anos após o terrível sismo que devastou Lisboa e várias localidades do sul do País. Em Setúbal, a 30 quilómetros do epicentro, os efeitos dos abalos de 1858 foram ainda piores, estimando-se que tenham atingido uma magnitude de 7.1, com destruição completa de algumas áreas da cidade, mas Lisboa também não passou incólume. Morreram pelo menos oito pessoas.

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Apesar dos ligeiros estremeções sentidos no dia anterior e durante a noite, ninguém queria acreditar que a catástrofe fosse repetível, pela manhã, como o grande terramoto de que todos haviam ouvido falar.


Poucos segundos bastaram. Em Setúbal, o bairro do Troino ficou praticamente arruinado, com derrocadas em praticamente todas as ruas, transformando-se numa cena «mortuária e ensanguentada». No largo da Fonte Nova, muitos edifícios ficaram danificados, havendo relato do mesmo na praça do Sapal, hoje batizada em homenagem ao poeta Bocage, onde a imponente igreja de São Julião (na imagem) sentiu os efeitos do abanão, com fendas nas paredes e ornatos caídos da fachada.
Toda a zona baixa foi afetada e, como é habitual, as moradas modestas foram as mais penalizadas, pois eram, de origem, menos firmes. Danos igualmente assinalados em alguns edifícios de maior porte, na muralha da cidade e no monumental Convento de Jesus, mais danificado do que em 1755.
Lisboa também acordou da pior maneira. A atmosfera era opressiva, as pessoas corriam desesperadas, descompostas, desprevenidas e, nas ruínas do Carmo, sobreviventes do grande terremoto, o lúgubre  e acelerado toque do sino do relógio acrescentava um som de agonia a tudo o que se passava em redor. As zonas do Rossio e Alfama foram as que sofreram mais estragos, mas felizmente não comparáveis aos infligidos pouco mais de um século antes: construções de menor relevância com fendas, derrocada de paredes, chaminés e elementos decorativos. Afetados ainda edifícios aparentemente sólidos, nomeadamente um dos reconstruídos torreões do Terreiro do Paço, a Basílica da Estrela, igrejas de São Roque e São João da Praça; o convento da Graça e a Sé, onde a torre sul e um dos arcos do claustro ficaram em risco de cair.

setubal avenida da praia atual luia todi.PNG

 

Em Setúbal, não tardaram tentativas de pilhagens e muitos que, tendo as suas casas arruinadas, montaram arraiais na praia, abrigando-se em barracas erguidas ali mesmo, fugindo ao vento forte e cortante e à copiosa chuva que caiu durante toda a infausta jornada. Por todo o lado se viam pessoas meio perdidas, feridas, aturdidas e sem saber o que fazer.


Nos dias seguintes, o mau tempo não amainou, mas foi criada uma comissão de socorros para acudir aos mais necessitados e também se fizeram subscrições em todo o país para ajudar os desvalidos do sismo. Deram-se numerosas esmolas, criou-se uma «sopa económica» para os que não tinham o que comer.

Ao todo, durante dois anos, foram reerguidas 181 casas, nomeadamente fazendo uso de materiais provenientes do antigo convento de Palmela. Em todas se colocou um azulejo com o seguinte dizer: «Beneficência 11 de novembro de 1858»setubal pessoas e vendedor de peixe junto a conser

 

 

De resto, o sismo foi sentido em todo o território de Portugal continental, mas com efeitos mais relevantes em Estremoz, Santarém, Seixal, Barreiro, Cartaxo, Montemor-o-Novo, Sesimbra, Évora e até na Batalha, onde o grande mosteiro abanou e sofreu estragos, mas sobreviveu a mais este confronto com a natureza.

 

 

À margem

O dia 11 de novembro seria, 60 anos após este sismo, o escolhido para a assinatura do armistício que marcou o fim da I Grande Guerra. Embora tal tenha decretado o fim dos combates na frente ocidental, foram necessários quase dois anos até que o conflito terminasse oficialmente, com o tratado de Versailles, firmado em janeiro de 1920.

armisticio.jpg

 

Na imagem, os principais intervenientes no acordo inicial, nomeadamente o marechal francês Ferdinand Foch e os almirantes ingleses Hope e Rosslyn Wemyss, representando os "Aliados"; Matthias Erzberger, pelo lado alemão.


Tudo aconteceu na denominada «carruagem do armistício», que seria palco também de outro acontecimento bem menos auspicioso: a negociação da rendição da França e das condições da sua capitulação, a 22 de junho de 1940, já durante a II Grande Guerra.

Hitler fez questão de usar o mesmo vagão e, para que a vingança fosse perfeita, até derrubou as paredes do Museu onde a carruagem estava instalada, de forma a que a mesma pudesse ser transportada para o local exato, Compiègne.

Mas isso é outra história...

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As imagens presentes são meramente ilustrativas da zona afetada e da época aproximada do sismo relatado.

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Fontes
Arquivo Distrital de Setúbal
Fundo Arquivo Pessoal de Almeida Carvalho
https://digitarq.adstb.arquivos.pt
Dos tremores de terra e em especial dos que se têm sentido em Lisboa; Imprensa União-Typográphica; Lisboa – 1858


run.unl.pt › bitstream › Vicencio_2017


https://digitalis-dsp.uc.pt/html/10316.2/27367/UCSIB-10-1-8-2-1935-V21_PDF/UCSIB-10-1-8-2-1935-V21_PDF_24-C-R0120/UCSIB-10-1-8-2-1935-V21_0000_Obra_Completa_t24-C-R0120.pdf?ln=pt-pt

 

https://pt.earthquake-report.com/2011/02/07/killer-earthquakes-in-portugal-mainland/


Imagens

https://pt.wikipedia.org/wiki/Set%C3%BAbal#/media/Ficheiro:Setubal_1860.jpg
https://pt.wikipedia.org/wiki/Armistício_de_Compiègne#/media/Ficheiro:Armisticetrain.jpg


Arquivo Fotográfico Municipal de Lisboa

Artur Bensabat Benarus
PT/AMLSB/ABB/000613
PT/AMLSB/ABB/000615
PT/AMLSB/ABB/000621

Carlos Alberto Lima
PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/ACU/000910

 

 

 

 

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