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O sal da história

Crónicas da história. Aventuras, curiosidades, insólitos, ligações improváveis... Heróis, vilões, vítimas e cidadãos comuns, aqui transformados em protagonistas de outros tempos.

O sal da história

Crónicas da história. Aventuras, curiosidades, insólitos, ligações improváveis... Heróis, vilões, vítimas e cidadãos comuns, aqui transformados em protagonistas de outros tempos.

Heróis do acaso (5): o homem que salvou o grande industrial

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Carlos Rei, segundo-sargento de Infantaria. Participou na terrível I Grande Guerra, mas foi o estado de tumulto em que Portugal se encontrava já em 1921 que fez dele o salvador de uma das maiores fortunas portuguesas. Aliás, nesse sentido, deve-se a este homem a concretização do maior complexo industrial que o País conheceu, porque salvou, nada mais, nada menos, que o empresário Alfredo da Silva.
Corria o mês de outubro. Escapando de dois atentados anteriores, à bomba e a tiro, sabendo-se na lista negra dos mentores da “camioneta fantasma”*, que no dia 19 tinha morto algumas das faces mais emblemáticas da implantação da República, Alfredo da Silva decide voltar as costas ao País. Segue de comboio para Espanha e acaba no centro de uma polémica a que era completamente alheio.
Em Leiria, a população juntara-se para a chegada do novo administrador do concelho, ilegalmente nomeado por aclamação popular. Convergiram na estação de caminho-de-ferro tanto os defensores, como os opositores desse estado de coisas. Os ânimos estavam pois acesos quando o putativo administrador, talvez para desviar as atenções de si e tendo descoberto que Alfredo da Silva era seu companheiro de viagem, começou a instigar a população contra ele.
O industrial apresentou-se sem medo, perguntando o que lhe queriam e, no meio da confusão que se gerou, foi atingido por uma bala. Ato contínuo, meteram-no numa viatura alegadamente para ser transportado ao hospital. Durante o caminho, no entanto, a multidão em fúria tirou-o da carrinha e agrediu-o violentamente, atirando-o ao chão. Teria, muito provavelmente, sido linchado ali mesmo, não fosse a intervenção de Carlos Rei, que se opôs a que a violência prosseguisse. Pôs-se entre os agressores e a vítima, pegou numa arma que outro manifestante tinha na mão e atirou para o ar, pedindo calma.
Só conseguiu, efetivamente, salvar Alfredo da Silva, porque entretanto as autoridades tinham sido avisadas e intervieram no tumulto, ajudando a dispersar.
Carlos Rei não sabia quem era Alfredo da Silva. Por isso, três dias depois, quando aquele o chamou ao Hospital, lhe agradeceu e lhe perguntou como poderia pagar o ato heroico que lhe havia salvo a vida, o ex-combatente nada pediu, até porque não havia sido a pensar em recompensas que tinha agido daquela forma. O industrial insistiu, instou-o a deixar a vida militar e ir trabalhar na CUF.
Foi só quando tomou consciência de quem era o homem que tinha livrado de morte certa e o que era a CUF – Companhia União Fabril, que Carlos Rei anuiu em apresentar-se nas fábricas do Barreiro.
Desde essa altura passou a ser trabalhador do grande grupo empresarial, onde progrediu e se manteve até à reforma. Alfredo da Silva, esse, nunca mais falou sobre ter sido salvo por este herói do acaso.


…..........

*A noite de 19 de outubro de 1921 foi a mais sangrenta da Primeira República (1910-1926). Um grupo de militares e civis percorreram Lisboa em busca de um conjunto de indivíduos marcados para morrer. Quando encontrados, eram obrigados e entrar na camioneta em que os perseguidores se deslocavam e executados. Assim, encontraram a morte, nomeadamente, o Primeiro-Ministro António Granjo; Machado Santos e Carlos da Maia, estes dois heróis da implantação da República no nosso País.

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Fontes

https://industriacuf.blogspot.com/2017/08/alfredo-da-silva-faleceu-ha-75-anos.html

Hemeroteca Digital de Lisboa
http://hemerotecadigital.cm-lisboa.pt/

Jornal a Capital
Várias datas nov. 1918; jun 1919

Illustração Portugueza
2ª série, nº 717 – 17 nov 1919


https://research.unl.pt/ws/portalfiles/portal/3698441/Lu_s_Farinha_A_Noite_Sangrenta_crime_e_castigo.pdf

https://industriacuf.blogspot.com/2017/08/alfredo-da-silva-faleceu-ha-75-anos.html

https://www.ordemengenheiros.pt/pt/centro-de-informacao/dossiers/historias-da-engenharia/no-centenario-da-cuf-o-grande-industrial-alfredo-da-silva-1871-1942-i/

http://app.parlamento.pt/comunicar/Artigo.aspx?ID=797

Imagem
A imagem usada é meramente ilustrativa, não reportando aos acontecimentos relatados.
Arquivo Fotográfico Municipal de Lisboa
http://arquivomunicipal.cm-lisboa.pt/pt/
PT/AMLSB/PEX/001039

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