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O sal da história

Crónicas da história. Aventuras, curiosidades, insólitos, ligações improváveis... Heróis, vilões, vítimas e cidadãos comuns, aqui transformados em protagonistas de outros tempos.

O sal da história

Crónicas da história. Aventuras, curiosidades, insólitos, ligações improváveis... Heróis, vilões, vítimas e cidadãos comuns, aqui transformados em protagonistas de outros tempos.

O escultor alcacerense que homenageou os outros mas quis passar incógnito

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As suas obras engrandecem figuras da história nacional, mas para si nunca quis reconhecimentos ou elogios. O trabalho de António Paiva está em locais públicos por todo o país, nomeadamente na sua terra natal, Alcácer do Sal, onde é um desconhecido.

 

V_Pmat_Estatua_Vasco_Gama_1_980_2500.jpgTodos os dias, quem habita ou visita Alcácer do Sal admira, sem o saber, obras que saíram das mãos de António Paiva e que estão em locais de destaque na mesma cidade alentejana onde, há 92 anos, nasceu este escultor, ali praticamente desconhecido. Com um vasto trabalho, amplamente aplaudido e premiado, passou parte da sua vida a desenhar e esculpir homenagens a grandes figuras nacionais, de Vasco da Gama, a Garcia de Resende, da rainha Santa Isabel aos seus conterrâneos, Pedro Nunes e João Branco Núncio. Quis o destino, ou a curta memória dos homens, que ainda não fosse devidamente homenageado na sua terra.

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António Luís do Amaral Branco de Paiva, um nome que junta três importantes famílias de Alcácer, nasceu a 12 de fevereiro de 1926 e cedo demonstrou vocação para as artes, ao estrear-se em exposições com apenas 17 anos. Aí, ainda aluno de liceu, recebeu o seu primeiro galardão nacional, nos Salões de Educação Estética da Mocidade Portuguesa.

Trabalhou com nomes relevantes do panorama artístico português, como Barata Feyo, Canto da Maya, António Duarte e Almada Negreiros. Na Escola de Belas Artes de Lisboa, onde a defesa de tese lhe valeu 19 valores, foi discípulo do conhecidíssimo Leopoldo de Almeida. Ganhou também uma bolsa da Fundação Calouste Gulbenkian, que lhe permitiu uma viagem de estudo a Itália.

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Em 1958, com uma obra colossal de enaltecimento aos portugueses, obteve o grande prémio da Exposição Internacional de Bruxelas, mas só 27 anos depois teve o privilégio de expor individualmente. Foi na Galeria de São Francisco, em Lisboa e, por essa altura, já tinha sido desenhador do Museu Etnológico de Belém; havia participado em numerosas mostras coletivas; tinha dedicado mais de duas décadas da sua existência ao ensino e muitas obras suas figuravam em espaços públicos por todo o País, nas fachadas de edifícios, em moedas e medalhas, entre as quais, a comemorativa dos 50 anos de toureio do primo João Branco Núncio.

E, no entanto, pouco se fala de António Paiva, em boa parte pelo espírito introvertido, pouco dado a fotografias ou notícias e avesso a publicidades. Numerosos trabalhos seus nem assinados estão, outros apresentam apenas a indicação A. Paiva.

Em comum, os traços alongados, simplificados, marcas da estética neofigurativa própria do segundo período de modernismo português, que procurou ruturas com os padrões tradicionalmente aceites.

Entre as obras de maior destaque estão as imagens de Vasco da Gama, em Sines; da Rainha Santa Isabel, em Estremoz; Garcia Resende, em Évora; Ricardo Jorge, junto ao instituto nacional com o mesmo nome; ou as alegorias, nos jardins do Hospital Cruz de Carvalho (Madeira).

 

Garcia resende.pngSão suas também numerosas peças de arte sacra alvo de devoção pelas igrejas de Portugal, nomeadamente na Igreja Matriz de Alcácer do Sal. É de sua autoria o conjunto escultórico “Justiça”, presente na fachada do tribunal, e a estátua de homenagem a Pedro Nunes, na praça com o nome desde, na mesma cidade, onde ambos nasceram.justica tribunal alcacer.JPG

Para além do local de origem e da vida dedicada ao ensino, outros elementos unem António Paiva e Pedro Nunes. Desde logo partilham a discrição e reserva com que viveram e que fazem com que hoje sejam muito poucas as referências encontradas sobre as suas vidas pessoais.

 

 

António Paiva morreu a 30 de junho de 1987. Para a posteridade fica o seu trabalho.

 

À margem

Pedro_Nunes_estatua.width-500.jpgMuito aclamado em Coimbra, onde se formou em medicina e matemática e posteriormente lecionou, Pedro Nunes foi também glorificado, por exemplo, ao ser representado no Padrão dos Descobrimento, no monumento a Camões ou em notas de 100 escudos. Em Alcácer do Sal, sua terra natal, no entanto, tardou uma homenagem em espaço público. Ainda no século XIX, chegaram a formar-se comissões com esse intuito e, mais tarde, houve intenção, por parte da Câmara Municipal de Lisboa, de oferecer a Alcácer um monumento alusivo a este vulto do século XVI: tratava-se de uma replica do que havia sido encomendado para figurar na avenida da Liberdade, mas que não chegaria ao seu destino. Foi só em 1978 que o município alentejano tomou a decisão de reconhecer, em local de destaque da cidade, o matemático e cosmógrafo-mor do reino. À frente da autarquia estava José Augusto Pomba Cupido, que atribuiu essa missão ao escultor alcacerense António Paiva. A estátua foi adjudicada por 320 mil escudos (cerca de 1.596 euros). Deveria alcançar os 2,80m de altura e ser produzida em três fases distintas, com protótipos em gesso e barro a aprovar antes do pagamento dos honorários. O resultado final, em bronze, está à vista de todos, mas a identidade do artista é pouco conhecida, tal como o é a vida privada de Pedro Nunes, aqui retratado.

 

Mas isso é outra história...

 

 

Fontes

Barbara Aniello , em

http://casadaruadealcolena.blogspot.pt/2009/12/152-antonio-luis-do-amaral-branco-de.html

http://www.numismatas.com/phpBB3/viewtopic.php?t=27024

 

https://www.parlamento.pt/VisitaParlamento/Paginas/BiogAntonioPaiva.aspx

 

http://www.cm-lisboa.pt/equipamentos/equipamento/info/ricardo-jorge

 

http://www.cm-alcacerdosal.pt/pt/municipio/concelho/personalidades/pedro-nunes/

 

http://www.sines.pt/frontoffice/pages/710

 

https://viverevora.blogspot.com/2012/04/personalidades-eborenses-garcia-de.html

 

Representações do Direito na Estatuária Urbana, de Ana Paula Gil Soares; Universidade de Lisboa - Faculdade de Letras, pós-doutoramento em Estudos Artísticos, Julho 2014, disponível em

https://www.google.pt/search?q=paiva+tribunal+alcacer+justi%C3%A7a+%22conjunto+escult%C3%B3rico%22&source=lnms&sa=X&ved=0ahUKEwjk58fU3tjcAhVDEVAKHSjFCZsQ_AUICSgA&biw=1280&bih=683&dpr=1

2 comentários

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    CV 17.08.2018

    Muito obrigada! um abraço CV
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