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O sal da história

Crónicas da história. Aventuras, curiosidades, insólitos, ligações improváveis... Heróis, vilões, vítimas e cidadãos comuns, aqui transformados em protagonistas de outros tempos.

O sal da história

Crónicas da história. Aventuras, curiosidades, insólitos, ligações improváveis... Heróis, vilões, vítimas e cidadãos comuns, aqui transformados em protagonistas de outros tempos.

Uma corrida de vaidades e famílias importantes

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António de Campos Valdez e António Caetano de Figueiredo, competiram para ver quem fornecia os melhores cavalos de lide e as mais magníficas e suculentas refeições aos muitos convidados ilustres que vieram de vapor para participar numa corrida de touros memorável.

O dia 6 de agosto de 1874 ficaria durante muito tempo na memória das “melhores” famílias de Alcácer e de um vasto conjunto de convidados que por ali andou nesse dia de verão. Uma comissão local, composta por homens ilustres, organizou uma tourada a preceito, mandando trazer de Lisboa cavaleiros tauromáquicos e todos os outros intervenientes. Entre os participantes, organizadores e público, estavam alguns nomes bem conhecidos da história recente daquele concelho alentejano e da tauromaquia nacional.

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Os visitantes chegaram num navio a vapor fretado para o efeito. Em Setúbal, de onde zarpou, havia sido preparado um magnífico almoço, que, no entanto, não pôde ser apreciado, devido à necessidade de avançar, face à mudança da maré, que poderia impedir a viagem pelo Sado.

Mas, não perderam pela demora: à chegada a Alcácer do Sal, António de Campos Valdez, um dos entusiastas do evento, tinha preparado outro repasto não menos abundante e requintado para quem vinha participar, muito provavelmente na casa que possuía no então largo da Regueira, que atualmente tem o seu nome e se situa muito próximo da “praia”, que constituía então a zona ribeirinha.

Valdez, que foi empresário do Real Teatro de S. Carlos durante duas décadas e deputado da nação, para além de grande proprietário e fundador de uma das bandas locais, foi também uma das figuras mais conhecidas de Lisboa e provavelmente o alcacerense mais viajado do seu tempo.

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Era um amante de fados e touros e forneceu dois dos animais montados durante a tourada, um dos quais, uma égua, morreria após uma marrada fatal nessa mesma tarde.

Os restantes cavalos foram fornecidos pelo seu amigo e depois adversário político e rival, António Caetano de Figueiredo, Visconde de Alcácer do Sal, fundador da outra banda de música ali existente.

O espetáculo terá acontecido, muito provavelmente, numa praça de madeira propriedade de João Alves de Sá Branco, que dirigiu a corrida, ou na denominada praça da cerca, junto ao antigo convento franciscano de Santo António.

Os camarotes estavam decorados com sanefas e neles exibia-se tudo o que era gente mais poderosa na vila.

A festa começou pelas 17 horas, após a chegada ao camarote principal do então administrador do concelho, Daniel Lima Trindade, que deu o mote para a entrada do cortejo no recinto.

Os cavaleiros foram José Avillez - provavelmente o filho do conde de Avilez, de Santiago do Cacém, irmão de Jorge de Avilez, que trouxe para Portugal o primeiro automóvel - e Dâmaso Xavier dos Santos [Leite], proprietário local, descendente de uma importante família do Cartaxo e cunhado do Visconde.

Os 13 toiros, eram do sr. Alcobia - Alfredo Alcobia, que também explorava as carreiras a vapor entre Alcácer e Setúbal – e de um Núncio, provavelmente Joaquim Mendes Núncio, que já criava rezes bravas e participou nesta corrida como moço de curro.

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Trata-se do avô paterno daquele que muitos consideram o maior cavaleiro tauromáquico de todos os tempos, o alcacerense João Branco Núncio (na imagem). Aliás, também neto do homem que estava a dirigir a tourada, João Alves de Sá Branco, que chegou a explorar a praça do Campo de Santana, em Lisboa.

Houve forcados com pegas emocionantes e bandarilheiros arrojados, com a particularidade de ter estado entre esta última categoria o sr. Alfredo Tinoco, que viria a ser um dos mais conhecidos cavaleiros do final do século XIX, tendo participado na inauguração da praça do Campo Pequeno.

Depois, juntaram-se todos em casa do visconde de Alcácer do Sal, onde se deliciaram com um extraordinário banquete, que só terminou à uma da manhã, hora a que tomaram o vapor de volta para Setúbal.

 

À margem

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A praça de touros João Branco Núncio, em Alcácer do Sal (na imagem), comemorou recentemente um século de existência, mas a afición local começou muito antes, na antiga cerca do denominado “Convento dos Frades” e numa praça de madeira, para além dos espaços mais privados, nas herdades das famílias importantes da terra, com destaque para os Branco e os Núncio, que se uniriam numa só.

A obra tinha originalmente apenas um piso, demorou vários anos a ser construída e foi levada a cabo por uma sociedade de acionistas que, no final, se resumia apenas a Joaquim Mendes Núncio Júnior, o mesmo que, em 1950, remodelou totalmente o edifício, subindo um piso, construindo camarotes, bancos e galerias.

Foram, desde aí, diversas as intervenções, adaptando o espaço às novas exigências de segurança.

Foi o filho do fundador, o cavaleiro João Branco Núncio, cujo nome a praça mantém e é homenageado em espaço próprio no interior desta, que doou o edifício à Santa Casa da Misericórdia de Alcácer do Sal, no quente ano de 1974, quando temia pelas suas propriedades e chegou a ver a sua casa ocupada.

Anualmente, realizam-se ali pelo menos duas corridas de touros, uma em junho, pela feira Pimel, e outra durante a Feira Nova de Outubro.

Em 2010, a lotação passou para 3.819 pessoas, devido à substituição de galerias por camarotes, mas, em todo o recinto, não existe qualquer lugar com o nº 13, medida imposta pela forte superstição de João Branco Núncio.

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Mas isso é outra história…

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Nota: as imagens são meramente ilustrativas do local, não correspindendo ao evento em si.

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Fontes

Biblioteca Nacional de Portugal (em linha)

www.purl.pt

Diário Illustrado

07.08.1874

 

Biblioteca Municipal de Alcácer do Sal

Voz do Sado

07.2007; 09.2022,  texto da autoria de Pedro Osório (Baltasar Flávio da Silva).

 

Direção-Geral do Património Cultural, citando ALMEIDA, Joaquim Duarte de, Enciclopédia Tauromáquica; MORAIS, António Manuel, A Praça de Touros de Lisboa, Campo Pequeno, Lisboa, 1992; OLIVEIRA, João Nunes, Praças de Touro em Portugal, Lisboa, 1997; Santa Casa da Misericórdia de Alcácer do Sal, Alcácer do Sal, 1998, em www.monumentos.pt.

Arquivo Histórico Municipal de Alcácer do Sal

PT/AHMALCS/CMALCS/BFS/02/05/001

Amarel…y Branco; João Núncio (O Bandarilheiro equestre), Lisboa 1930

 

Processo Praça de Touros de Alcácer do Sal – licenciamento recintos para espectáculos– documentação não tratada arquivisticamente, 1979-2010

 

Imagens

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Farpas Blogue: Mestre João Núncio nasceu há 120 anos

Praça de Touros João Branco Núncio - Alcácer do Sal | All About Portugal

De Porta Aberta: Mestre João Nuncio, 34 anos de Saudade. (deportaberta.blogspot.com)

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